Coisa de Loco | Por: Adaelson Alves Silva



Dr. Adaelson Alves Silva, piritibano, radicado no Paraná, médico Nefrologista. E autor da crônica "Coisa de Loco".

Veja mais um episódio da Série "Um Dedo De Prosa".

Pois bem. Morávamos na Rua do São Domingos, hoje, Rua da Independência. Na minha casa, além de todos os filhos, minha mãe sempre fez questão de criar mais alguns agregados. Na maioria das vezes, sempre alguém fraco das faculdades mentais.

Hoje vou falar de Zé Doido, um menino bom, porém fraco dos miolos. Um dia, um dos irmãos ameaçou minha mãe dizendo: “nesta casa fica eu ou Zé Doido, não posso mais conviver com as traquinagens de Zé”.

D. Adailde, a mãe, soube muito bem contornar a situação. Toco e Zé Doido continuaram vivendo em  harmonia desarmônica.

Na nossa casa tinha um belo quintal, povoado por vários pés de árvores frutíferas. Lembro-me do garboso pé de manga espada, testemunha ocular de muitas ocorrências, algumas delas só conto na presença do meu advogado. Tinha também pé de pinha, outro de fruta-do-conde, goiabeira, pé de pitanga, laranjeiras e outras.

Era costume meu, esperar os passarinhos com comida, que deixava cuidadosamente embaixo do pé de romã.

Um dia quente, muito quente, eu pedi para Zé Doido colocar um pouco de milho moído para os passarinhos. Falei e fui para o quarto descansar. Não demorou muito, comecei a ouvir pequenas e seguidas explosões. Fiquei incomodado e fui conferir. Gente, a cena que presenciei foi chocante: passarinhos destroçados, cabeça para um lado, asas para o outro, pernas no telhado. A cabeça do Curió foi parar na mesa da cozinha. O Tico-tico virou apenas um tico. O Bem-te-vi, jamais foi visto. E a madame deve estar a perguntar do Papa Capim. Confesso que vi apenas uma folhinha de capim jogada ao lado dos destroços da Coleirinha.

Então, vamos explicar o motivo de tamanha tragédia. Zé Doido, ao invés de colocar um pouco de milho moído para os passarinhos, colocou milho de pipoca, que com aquele calor infernal começou a explodir destruindo os pobres pássaros. Confesso que foi o maior “passarocídio” que eu já presenciei.

Depois deste episódio, Zé Louco fugiu de nossa casa, acompanhado de Cabecinha de Aio, outro doidinho de plantão.

Cabecinha de Aio, com a sua “doidura”, incomodava muito pouco.

Anos após a fuga dos dois rebeldes mentais, ficamos sabendo que eles estavam internados no Manicômio de Feira de Santana. Foram medicados e tiveram melhora acentuada.

                     Pois bem, alguns meses depois, Zé Louco, em conluio com Cabecinha de Aio, programaram uma fuga do Manicômio. Seria no sábado.

Durante toda a semana, eles pulavam o muro e voltavam para o interior do Hospício. Era apenas o treino para o grande dia.

Na sexta-feira, véspera do dia da fuga, choveu forte na madrugada. Chuva de mais de metro. Cabecinha de Aio acordou e mandou o parceiro olhar se estava tudo limpo para a fuga. Zé Doido foi lá e voltou com cara de desanimado, dizendo:

- Não vai dar para fugir não.

- Oxente, por que não vai dar?

- É que a chuva derrubou o muro.

Se Zé e Cabecinha de Aio não ganharam a independência, Piritiba ganhou. Viva 27 de Setembro!



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